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A PRINCESA E O DRAGÃO


Não é um conto de fada. Nem tampouco irei falar de uma princesa indefesa e muito menos de um príncipe. Na verdade, de princesa ela não tem quase nada, salvo o charme, a beleza e a educação. Para ser sincero com você, caro leitor, ela até ficará irritada com o título que dei a esse conto. Mas para ficar claro, o título está mais relacionado ao dragão, sim, temos uma dragão em nossa história, e ela ficou com o título de princesa por associação, por analogia.
            Repito, ela odeia que a chame de princesa. Prefere que se dirijam a ela pelo seu nome, Dane, não é uma abreviação de Daniele, nem muito menos de Daniela, mas seu nome original. Seu nome era Dane, e era assim que ela gostava de ser chamada. Uma moça inteligente e muito, extremamente educada e ética. Trabalhava como escritora em um site literário, publicava contos todas as sextas-feiras. Não, ela não é uma personagem do século XIX, eu a conheci em fevereiro de 2019, quando também fui trabalhar nessa revista digital.
            Cheguei à redação do site/revista Elitera, que trazia um novo conceito de produção e consumo de literatura na era digital. Fui trabalhar nessa revista justamente atraído por essa nova visão da literatura. Eu não era um ótimo escritor, e ainda não sou, mas para a Elitera  o que realmente importava era o olhar que tínhamos dos acontecimentos diários e a maneira como contávamos as histórias, de forma simples e clara. O que atrairia novos leitores e colocava o jovem no centro da produção e consumo dos textos literários. Estávamos trabalhando com um novo conceito: O leitor protagonista.
            Naquela manhã, meu primeiro dia no novo trabalho, entrei na sala com tanto medo. Diante daquelas pessoas a me olhar, não sabia o que mais me consumia, o medo ou o constrangimento. Dane, de sua cadeira, acenou e apontou para uma cadeira vazia do seu lado, indicando para eu sentar. Apresentei-me a Dane e a sua colega de trabalho Riany, as duas pareciam muito amigas e conversavam e riam e trabalhavam, tudo ao mesmo tempo.
            Reli novamente o material que orientava a produção literária e todos os conceitos novos que orientava a produção e publicação dos textos. Fiquei totalmente perdido. Apesar de conhecer inúmeras palavras, aqueles conceitos eram para mim estranhos. Porém, Dane se incumbiu de me orientar, e eu tinha muitas dúvidas e ela muita paciência. Foi o dia inteiro de muita conversa, e em meio a essas conversas descobri que Riany era chefe de setor a quem deveríamos responder. Senti que tinha encontrado meu emprego dos sonhos. Isso durou até o dragão invadir a torre e cuspir fogo para todos os lados.
            A editora chefe entrou e mais parecia o ditador da Coreia do Norte. Todos se calaram e apenas anotaram as ordens do Dragão, que descobri minutos depois, chamava-se Lyke. Não quis saber se esse era realmente seu nome ou apenas um apelido. Nada nela me interessava. E não pense, caro leitor, que Lyke se igualava a Maryl Streep em o “Diabo veste prada”. Peço-lhe desculpa caso tenha construído na minha descrição essa imagem dela. O dragão que entrou na redação parecia não saber do que estava falando e em seu discurso não tinha quase nada do que eu tinha lido no material da Elitera, que tinha como público alvo o Jovem: leitor protagonista.
            Dane sempre muito bem centrada conversou comigo e inteirou-me de alguns conflitos entre a chefe de redação e os demais funcionários da empresa. Chegou a me dizer em uma de nossas pausas para um cafezinho que acreditava que Lyke estava mudando. E como pouco a pouco fui vendo o perfil da nossa chefe, confessei a Dane que achava essa mudança muito improvável. Riany também compartilhava dessa minha visão da não mudança do dragão e ficamos bons amigos, não por esse caso, mas pela maneira como convivíamos.
            Entre a gente nunca faltava assunto, e quando os jovens leitores vinham a redação conhecer a gente ou pegar algum autógrafo a gente compartilhava. Aprendi muito com elas duas e isso me permitiu continuar desenvolvendo um trabalho na Elitera, que como o delas, considero, de qualidade. Mas aos olhos de Lyke eu não me adequava à empresa. No entanto, meus textos eram lidos por muitos leitores protagonistas e aprovados por eles. Esse deve ter sido o motivo porque eu continuei trabalhando na revista. Sempre que os executivos liam os relatórios percebiam que Dane, Riany e eu éramos bons profissionais.
            Aos olhos de Lyke não servíamos para empresa, e de todos eu era o pior, a fruta podre que tinha contaminado o grupo e corrompido Dane, a inocente e ingênua, aos olhos de nossa chefe. No entanto, isso não me ofendia, não tanto quanto ofendia a Dane, uma vez que ela nunca fora ingênua e muito menos inocente. Longe disso, Dane era uma mulher centrada de opinião própria e muito analítica. Aquilo que o Dragão chamava de ingenuidade, eu chamo de ética, de profissionalismo.
            Os textos antes escritos com muita criatividade e entusiasmo sofreram com o conflito. Fomos parar em reunião extraordinária com os executivos da revista e Lyke jurou que não havia feito nada de errado. No entanto, seu discurso se diferia do discurso dos demais e ela foi orientada a tratar com respeito seus funcionários. Mas isso não aconteceu. Continuamos contando histórias magnificas, mas, vivendo situações constrangedoras.
            A princesa e o dragão não se enfrentam, mas o calor do fogo expelido diariamente pelo dragão nos sufoca. E continuamos nesse ambiente insalubre sobrevivendo porque precisamos do dinheiro, mas resistindo e contando a nossa história em outros enredos, fazendo com que nossos personagens vivam nossos dramas e angústias. E vez ou outra nos tornamos leitores protagonistas de nossas próprias histórias para criar histórias protagonizadas por nós mesmos.

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